Amizade Filosófica, uma Virtude
- sitesacredsecond
- 30 de mar. de 2017
- 5 min de leitura

Antes de começar a ler, estudar e refletir para poder falar sobre esse tema, eu acreditava que tinha muitos amigos. Na verdade, eu acreditava que tinha apenas amigos já que eu nunca gostei de relações superficiais. Eu sempre evitei coleguismo.
Bom, e qual é a diferença entre a amizade filosófica e o que as pessoas chamam hoje de amigos, ou colegas? Como sabemos, hoje os termos estão cada vez mais vazios. Existe um esvaziamento das palavras, um empobrecimento da linguagem. Não é a toa que hoje é tão difícil de expressar os sentimentos porque ninguém mais sabe o significado das palavras. Nossa vida não é mais tão símbólica e isso também reflete no empobrecimento da linguagem. E com a amizade não é diferente. Já não sabemos mais o que é amizade e por isso chamamos as diversas relações entre pessoas que não envolve relação homem x mulher de amizade. Então o objetivo desse texto será resgatarmos o conceito de amizade com base na filosofia para que possamos nos aprofundar mais e perceber que existe um ideal por trás dessa palavra.
O que é Amiguismo? O Amiguismo é próprio das circunstâncias, fácil, inconstante. É evidente que se baseio uma relação em circunstâncias, essa relação será inconsistente. É da natureza da circunstância ser mutável. Então se a situação muda, eu não quero mais aquela relação. Se eu tenho um resultado diferente do que eu espero, eu não quero mais aquela relação. Eu me afasto. E isso torna as relações descartáveis. E se a relação é descartável eu não estou olhando para o outro, mas para o resultado que o outro me dá, para o benefício que ele me gera. Se eu tenho alguém para sanar minhas carências, alguém para reclamar minhas mazelas, ou falar sobre os infortúnios que me aflige, alguém apenas para me satisfazer, isso não é amizade. É manipulação. Eu não quero saber quem é o outro, eu não quero saber sobre os sentimentos do outro, eu não quero me integrar ao outro. Isso dá muito trabalho. Então eu estou usando o outro. Em uma situação extrema, passa-se a crer que o outro vive apenas para suprir minhas expectativas. É uma relação própria dos desejos e do interesse pessoal. E se minhas expectativas não são cumpridas, me ofendo, fico com raiva, julgo. E isso gera um movimento contrário ao caminho da humanização. Gera isolamento. Vai contra nossa principal necessidade: Fraternidade.
“Vosso amigo é a repsosta às vossas necessidades (…) É vosso apoio e vosso abrigo” – Gibran
E que necessidade é essa? Segundo Gibran o amigo responde à necessidade que temos de nos humanizar, de estabelecer uma relação humana com o outro. Permite que eu seja menos egoísta e pense mais no outro. Um amigo nos dá essa oportunidade.
Quem teve a oportunidade de comparecer ao dia internacional da filosofia e ver a palestra do Luis Carlos Marques, sabe sobre a importância da convivência. Sobre a importância que o outro tem para nos ajudar a nos desenvolver já que é na convivência que nossos conflitos se revelam. E nossos conflitos influenciam nas forma como nos relacionamos. É na convivência que crescemos e crescemos uns com os outros pois o outro reflete quem eu sou, o que eu penso e o que eu faço.
Quando eu uso o outro estou cometendo o ato mais imoral, pois o outro é um fim em si mesmo e não o meio para eu me satisfazer. Então um verdadeiro amigo doa sem esperar nada em troca, apenas por querer o bem do outro. E quando frutifica, há gratidão e paz por ter feito aquilo que é próprio do ser humano.
É um apoio, pois me faz crescer, porque quando me apoio nele chego mais longe. Eu me torno alguém melhor. Um verdadeiro amigo nos protege. Nos protege do externo, mas principalmente de nós mesmos, dos nosso vícios, das nossas escolhas que podem nos prejudicar. Portanto age como um elemento de consciência externa. Por essa razão, nem sempre dirá coisas que serão agradáveis de ouvir, mas serão necessariamente verdadeiras.
Para Emerson, as amizades são dons e expressões de Deus. É quando o espírito divido de uma pessoa se encontra com o espírito divido de outra pessoa e anula os muros da personalidade. Amigo é alguém com quem eu posso ser sincero. Gente, sinceridade hoje é um luxo! Quem consegue falar o que realmente pensa ou sente sem o medo de ser julgado? Ninguém quer se revelar porque isso gera uma vulnerabilidade. Eu não sei o que o outro vai fazer comigo, ou que ele vai pensar de mim. Pois é… para termos uma relação autêntica, é necessário sinceridade. É necessário se abrir e correr o risco. Eu chego à presença de um homem tão real e tão igual que não preciso de usar máscaras.
Se um amigo é o reflexo da sua própria alma, então uma amizade só pode acontecer entre homens de bem. É isso que vai dizer Cícero. E como assim homens de bem? Homens que são éticos, que possuem moral, pois é a qualidade que possibilita a amizade. Quando uma relação é a baseada no caráter, nasce a harmonia a fidelidade e a permanência. Portanto, quando falamos de reflexos, falamos de um reflexo também moral. Ou seja, eu faço porque é bom, porque eu quero o bem daquela pessoa e não pelos meus interesses pessoais. Eu ajo em prol do outro porque eu tenho um afeto profundo executo minhas ações com boa vontade, doando-me ao outro. Ou seja, não existe uma vantagem que não seja partilhada igualmente por ambos. Acalenta as esperanças através do afeto.
Lembra quando falamos sobre amizade por interesse? Aristóteles vai definir três tipos de amizades. Amizades de prazer, que é medido pelo quanto é agradável e portanto, isso não é amizade verdadeira, pois é uma amizade de prazeres fáceis, prazeres que alimentam nossa personalidade e não no nosso caráter. Ou seja, eu amo porque é prazeroso.
Amizades de utilidade: igualmente não é uma amizade verdadeira, exceto quando disso surgir algum benefício a si mesmos. Então eu amo meus amigos pela utilidade, pelo bem que eles ME fazem.
Ou seja, nenhuma dessas relações se configura a amizade de fato, pois a medida é o quanto ele é útil ou agradável a mim ao invés da medida ser o quanto o amigo é amado. Eu não amo o que ele faz e nem o que ele é. Quando eu cultivo esperando que dê frutos, isso não é amizade, é comércio. Então eu vou ser amiga dessa pessoa porque ela é influente, porque ela tem conhecimento sobre tal assunto ou porque ela tem dinheiro. Ela pode me beneficiar. Ou seja, isso se torna um investimento. Quando a medida é o amor, você cultiva pelo bem do outro. E segundo Aristóteles, isso exige tempo e exige intimidade. Sem esses dois fatores não podemos ter nos revelado tal como somos e se somos de fato dignos da amizade.
Para finalizar, a amizade filosófica pressupõe amor ao conhecimento do outro. Supera o tempo e as dificuldade. Aprofunda o espírito. É solidário e tem apoio mútuo em todos os momentos. Nasce à partir da partilha de ideais comuns, metas de vida, um espírito de serviço e superação. Perdoa sem deixar de corrigir e acima de tudo, estimula a fraternidade. Esse tipo de amizade é para homens de ouro em que ambos possuem uma consciência mais elevada. É rara, porém valiosa. Vale a pena tornar sua alma uma alma de ouro para que, ao se deparar com outra alma de ouro, essa relação seja possível de ser construida.

















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